sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

2012...o ciclo se renova.





"Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se
E— ó delicioso vôo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança...
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA..."

Mário Quintana

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Meu Natal e o bolo xadrez.



É indiscutível reconhecer que o Natal me emociona.
Quando a cidade se tinge de verdes e vermelhos e o dourado se confunde com as luzes , sinto uma inefável sensação de prazer. Desempacotar os enfeites cuidadosamente guardados e transformar minha casa em novas cores e  brilhos tem um sabor especial. Mas, enquanto a casa vai se modificando, um lugarzinho da minha alma permanece inquieto,incomodado.

Definitivamente falta algo, mas o quê?
Eu sei, mas procuro fugir da constatação. Passamos o ano inteiro em “mesas de iguarias de Natal”, ganhamos presentes todos os dias, esquecemo-nos de rezar e agradecer, só sabemos pedir e – o mais triste- a família se dispersou.
Na minha infância / adolescência nunca houve ceia. Íamos à Missa do Galo com a ansiedade do depois. E...reuniamo-nos diante de um caprichado bolo xadrez  que havíamos “namorado” o dia inteiro, enquanto minha mãe temperava carnes, picava legumes e tudo se transformava em uma mesa- de almoço - onde nada havia sido feito “fora de casa”.

O cheiro do cipreste impregnava a casa toda, havia um brilho especial nos olhos, mesmo não entendendo o porquê de nossos Natais serem agraciados com presentes tão simples: uma caixa de bombons,um livro de história...Em 1954 , ganhei um exemplar lindo : A Rainha das Neves , de Andersen,embora estivesse longe do presente desejado, uma bicicleta que meu pai não pode comprar.
 Hoje, posso comprar mais que uma, mas não a quero, quero meu pai, no Natal...mas , ele, já está encantado por aí.E o tender fica com o sabor da alegria dele  que o apreciava tanto.

Quanto sabia eu da felicidade naquela época? 

Minha mãe ainda vive (?) sem nem saber direito que é Natal e para que serve.Está partindo aos pouquinhos diante dos nossos olhos.E continuo com o coração dividido : as filhas que chegam, o presente das netas, os amigos que restaram, e a sensação dolorida de que olhar para minha linda e enfeitada casa não é suficiente. O ruído da festa não preenche por inteiro meu coração.Estou feliz pelo que tenho, mas nessa data sinto uma falta imensa do que se foi e dos que se foram.
Definitivamente falta algo que eu nunca vou poder comprar.
Lindo e triste Natal.


PS : A receita do bolo xadrez permaneceu intacta, mas os ingredientes principais foram-se ao sabor do tempo.


Gizelda.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

100.000 visitas...Selo Comemorativo.Felizzzzz!!!!





100.000 visitas!!!!!!

É pouco? É muito?
É exatamente o que faz, agora , meu coração feliz.
E “ ELE’,  mesmo “ todos ELES’, isto é Fernando PESSOA com todas as pessoas que é, honrosamente ilustra o selinho comemorativo.

É meu, é seu, é nosso. Leve-o com você.


A todos os que aqui vieram , vem ou virão, muito obrigada  pela presença, pelos comentários. Voltem e sintam-se em casa.

Beijos.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Fácil é dar um beijo. Difícil é entregar a alma.



Falar é completamente fácil, quando se tem palavras em mente que expressem sua opinião. Difícil é expressar por gestos e atitudes o que realmente queremos dizer, o quanto queremos dizer, antes que a pessoa se vá. 
Fácil é julgar pessoas que estão sendo expostas pelas circunstâncias. Difícil é encontrar e refletir sobre os seus erros, ou tentar fazer diferente algo que já fez muito errado.
 Fácil é ser colega, fazer companhia a alguém, dizer o que ele deseja ouvir. Difícil é ser amigo para todas as horas e dizer sempre a verdade quando for preciso. E com confiança no que diz. 
Fácil é analisar a situação alheia e poder aconselhar sobre esta situação. Difícil é vivenciar esta situação e saber o que fazer. Ou ter coragem pra fazer.
 Fácil é demonstrar raiva e impaciência quando algo o deixa irritado. Difícil é expressar o seu amor a alguém que realmente te conhece, te respeita e te entende. E é assim que perdemos pessoas especiais. Fácil é mentir aos quatro ventos o que tentamos camuflar.Difícil é mentir para o nosso coração.     Fácil é ver o que queremos enxergar.Difícil é saber que nos iludimos com o que achávamos ter visto. Admitir que nos deixamos levar, mais uma vez, isso é difícil. 
Fácil é dizer "oi" ou "como vai?"Difícil é dizer "adeus". Principalmente quando somos culpados pela partida de alguém de nossas vidas...
 Fácil é abraçar, apertar as mãos, beijar de olhos fechados. Difícil é sentir a energia que é transmitida. Aquela que toma conta do corpo como uma corrente elétrica quando tocamos a pessoa certa. 
Fácil é querer ser amado. Difícil é amar completamente só. Amar de verdade, sem ter medo de viver, sem ter medo do depois. Amar e se entregar. E aprender a dar valor somente a quem te ama.
 Fácil é ouvir a música que toca. Difícil é ouvir a sua consciência. Acenando o tempo todo, mostrando nossas escolhas erradas.
Fácil é ditar regras. Difícil é seguí-las. Ter a noção exata de nossas próprias vidas, ao invés de ter noção das vidas dos outros. 
Fácil é perguntar o que deseja saber. Difícil é estar preparado para escutar esta resposta. Ou querer entender a resposta. 
Fácil é chorar ou sorrir quando der vontade. Difícil é sorrir com vontade de chorar ou chorar de rir, de alegria. 
Fácil é dar um beijo. Difícil é entregar a alma. Sinceramente, por inteiro. 
Fácil é sair com várias pessoas ao longo da vida. Difícil é entender que pouquíssimas delas vão te aceitar como você é e te fazer feliz por inteiro. 
Fácil é ocupar um lugar na caderneta telefônica. Difícil é ocupar o coração de alguém. Saber que se é realmente amado. 
Fácil é sonhar todas as noites. Difícil é lutar por um sonho.
Eterno, é tudo aquilo que dura uma fração de segundo, mas com tamanha intensidade, que se petrifica, e nenhuma força jamais o resgata. 


Carlos Drummond de Andrade



A difícil arte de viver...uma constatação óbvia.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

A consciência de continuar sendo é tão avassaladora quanto a consciência de ter sido.




Você pode imaginar o que é a velhice? É claro que não. Eu não podia. Nunca consegui. Não fazia ideia do que era. Não tinha nem mesmo uma imagem falsa – não tinha imagem nenhuma. E ninguém quer outra coisa. Ninguém quer encarar a velhice antes de ser obrigado a encará-la. Como é que tudo vai terminar? Em relação a isso, ser obtuso é de rigueur.
Por motivos óbvios, é impossível imaginar uma etapa de vida posterior àquela em que estamos. Às vezes já chegamos na metade da fase seguinte quando nos damos conta de que já estamos nela. Além disso, as primeiras etapas da velhice têm lá suas vantagens. Mesmo assim, as intermediárias são ameaçadoras para muita gente. Mas e a etapa final? Curioso – é a primeira vez na vida que você consegue ficar completamente de fora da situação que você está vivendo. Observar a decadência do próprio corpo de um ponto de vista externo (para quem tem a sorte que eu tive) permite que a gente se sinta, graças à vitalidade que continua a ter, a uma distância razoável dessa decadência – às vezes dá até para sentir-se orgulhosamente independente dela. Sem dúvida, vão aumentando cada vez mais os sinais que nos levam a tirar aquela conclusão desagradável, mas assim mesmo a gente continua de fora. E a fúria dessa objetividade é brutal.

É importante traçar uma distinção entre o morrer e a morte. O morrer não é um processo ininterrupto. Se a gente tem saúde e se sente bem, é um processo invisível. O final que é uma certeza nem sempre se anuncia de maneira espalhafatosa. Não, você não consegue entender. A única coisa que você entende a respeito dos velhos quando você não é velho é que eles foram marcados pelo tempo. Mas compreender só tem um efeito de fixá-los no tempo deles, e assim você não compreende nada. Para aqueles que ainda não são velhos, ser velho significa ter sido. Porém ser velho significa também que, apesar e além de ter sido, você continua sendo. Esse ter sido ainda está cheio de vida. Você continua sendo, e a consciência de continuar sendo é tão avassaladora quanto a consciência de ter sido. Eis uma maneira de encarar a velhice: é a época da vida em que a consciência de que a sua vida está em jogo é apenas um fato cotidiano. É impossível não saber o fim que o aguarda em breve. O silêncio em que você vai mergulhar para sempre. Fora isso, tudo é tal como antes. Fora isso, você continua sendo imortal enquanto vive.

O animal moribundo -Philip Roth

sábado, 3 de dezembro de 2011

Dos flocos caem desejos.





Eu,
um de nós, talvez a geométrica flor, tenho experimentado
a sensação - que até agora desconhecia -, que estar
vivo e estar só é um sinal de alegria,
semelhante ao tombar da neve.


Se as espirais delicadas do contato com os outros (cada
vez mais delicadas) se transformam em mais frágeis à medida
que a sensibilidade aos atos de linguagem - e aos 
atos -cresce,


esta face a face sem intermediários humanos com as coisas
pode fazê-las transparecer num espaço máximo.


É talvez uma fase nova da aprendizagem da leitura - será
preciso entrar nesse espaço em que dos flocos já caem letras 
para usar finamente o privilégio de ensiná-las aos animais do Mosteiro, 
chamamento que aqui demos à sua 
contemplação. 


Mosteiro e monstro - e os caminhos transitáveis entre eles;
por fim, suponho que o nosso cântico de leitura dará nascimento a híbridos. 


Maria Gabriela LLansol, Os Cantores de Leitura, Assírio & Alvim, 
p. 22


Vontade intensa de ser mar, sendo só areia.De não ser substantivo, ser verbo, sempre.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

O Deus de cada um.



O senhor... Mire veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas — mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou. Isso que me alegra, montão. E, outra coisa: o diabo, é às brutas; mas Deus é traiçoeiro! Ah, uma beleza de traiçoeiro — dá gosto! A força dele,quando quer — moço! — me dá o medo pavor! Deus vem vindo: ninguém não vê. Ele faz é na lei do mansinho — assim é o milagre.
E Deus ataca bonito, se divertindo, se economiza.

(João Guimarães Rosa, Grande Sertão: veredas.)


Combate
Nem eu posso com Deus nem pode ele comigo.
Essa peleja é vã, essa luta no escuro
entre mim e seu nome.
Não me persegue Deus no dia claro.
Arma, à noite, emboscadas.
Enredo-me, debato-me, invectivo
e me liberto, escalavrado.
De manhã, à hora do café, sou eu quem desafia.
Volta-me as costas, sequer me escuta,
e o dia não é creditado a nenhum dos contendores.
Deus golpeia à traição.
Também uso para com ele táticas covardes.
E o vencedor (se vencedor houver) não sentirá prazer
pela vitória equívoca.

(Carlos Drummond de Andrade)

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Para sempre...


Minha querida Titi...

Um ano sem você, sem sua cumplicidade, sem seus afagos, sem seus olhinhos brilhando, sem que haja atrás da porta alguém que me ame profundamente, mesmo que eu não mereça...

Sua ternura inundou a minha vida de abnegação e companheirismo.Você se foi, mas sua imagem me olha de todos os cantos da casa.

Esteja onde estiver, saiba que continuo a te amar .

Para sempre.

sábado, 19 de novembro de 2011

A alma pode sorrir.



Quando acordo em um fim de semana - como hoje - e olho através do céu azul e perfumado, a brisa fresca desafiando o dourado do sol, sinto que meu momento é aqui e agora. Dezembro está quase aí.

Recuso-me a ir aquém ou além para saborear o que sou, em que me tornei, das minhas opções e escolhas, e sei, com toda certeza possível, que há muito a fazer e conquistar e não tenho tempo suficiente  ( nem idade...) para ousada busca.

Nem de longe a vida se comportou de acordo com o que planejei  e  até agora não descobri se a conduzi ou fui conduzida por ela. Mas o que importa? O resultado é o sou e  o que tenho.

Sei também que, quando esse ímpeto cessar , terei desistido de viver. E nem de longe quero me tornar uma morta-viva.

Em minha casa, as caixas de bolas vermelhas saem dos maleiros, os tons de prata, o cheiro da tuia ainda tenra, tudo começa a tomar a cor do Natal. E o cheiro. E o clima. Não é a data, mas o envolvimento com o burburinho que me seduz. E o antes.

O  som é de Michael Bublé... e sinto um imenso prazer de estar viva . Minha alma sorri.Apesar de.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Da queda nasce a ascensão.



(…) A perda das forças não esgota a vontade. Crer é apenas a segunda potência; a primeira é querer; as montanhas proverbiais que a fé transporta nada valem ao lado do que a vontade produz.” 


(…) Não deixar discutir a consciência, nem desarmar a vontade, é assim que se obtêm o sofrimento e o triunfo. Na ordem dos fatos morais o cair não exclui o pairar. Da queda sai a ascensão. Os medíocres deixam-se perder pelo obstáculo especioso; não assim os fortes. Parecer é o talvez dos fortes, conquistar é a certeza deles.


Os Trabalhadores do Mar (excertos)- Victor Hugo

domingo, 13 de novembro de 2011

Estrelas, estrelas,rezo.




Por que surgem em mim
essas sedes estranhas? A chuva e as estrelas, essa mistura
fria e densa me acordou, 
abriu as portas de meu bosque verde e sombrio, 
desse bosque
com cheiro de abismo onde
corre água. E uniu-o à noite.
Aqui, junto à janela, o ar é mais calmo.
 Estrelas, estrelas, rezo. 
A palavra estala entre meus dentes em estilhaços
frágeis. Porque não vem a chuva dentro de mim, eu quero
ser estrela. Purificai-me um pouco e terei a massa desses
seres que se guardam atrás da chuva.


Clarice Lispector in  Perto do Coração Selvagem.


Sem palavras.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Um amor precisa de espaço para voar.



Uma casa deve ter varandas para sonhar, 
cantos para chorar, 
quartos para os segredos e a ambivalência. 


Um amor precisa espaço de voar,
liberdade para querer ficar, 
alegria 
e algum desassossego contra o tédio. 
Não se esqueçam os danos a cobrir, o medo de partir, e o dom de surpreender - que é a sua essência.


Lya Luft


Liberdade para querer ficar e o medo de partir...difícil , muito difícil,talvez por isso  o amor verdadeiro só se completa dentro de nós.O outro é a borboleta a bater asas.

domingo, 6 de novembro de 2011

Não como quem sonha, mas como quem vê.



Voltei pela mesma estrada poeirenta por onde sai , um dia...Um atalho verde-sujo de canaviais- onde estão os cafezais da minha infância?-são pontilhados por árvores deslumbrantemente avermelhadas.

A cidadezinha - ontem e sempre - começa pelo cemitério. Estranho e familiar.Estaciono o carro debaixo de frondosos flamboyants floridos que me cobrem do sol quente.Atrás dos muros , meu pai, avós, tios , amigos...um pedaço grande da minha história.

Hesito.Não vou entrar.Guardo-me e guardo-os. Eles não estão ali. Só eu estou.

Viro-me antes que alguém me reconheça-será?-dobro à esquerda no que deveria ser um lugar familiar.Não é mais. A ruazinha acanhada , hoje uma avenida, e as poucas pessoas pelas quais passo me são estranhas, não as reconheço, assim como elas não sabem de mim.

Ecos de um tempo distante me angustiam.Vejo além. São minhas raízes enterradas no tempo.Gostaria enormemente de não estar ali.Melhor a lembrança do que a constatação.

Tomo de volta a mesma estrada, não como quem sonha, mas como quem vê.

A cidade é, ainda hoje, minha raiz,mas deixo-a para trás e entro em casa com o desalento de quem tem certeza de que o tempo-ontem se foi.


sexta-feira, 4 de novembro de 2011

O desassossego é amarelo.



"Busco-me e não me encontro. Pertenço a horas crisântemos, nítidas em alongamentos de jarros. Devo fazer da minha alma uma coisa decorativa"


Livro do Desassossego - Bernardo Soares.


...sempre ele a bafejar lufadas de brisa fresca no que fui, no que sou e no que ainda quero ser.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Escrever é triste.





Hoje não escrevo
     
Chega um dia de falta de assunto. Ou, mais propriamente, de falta de apetite para os milhares de assuntos.
     Escrever é triste. Impede a conjugação de tantos outros verbos. Os dedos sobre o teclado, as letras se reunindo com maior ou menor velocidade, mas com igual indiferença pelo que vão dizendo, enquanto lá fora a vida estoura não só em bombas como também em dádivas de toda natureza, inclusive a simples claridade da hora, vedada a você, que está de olho na maquininha. O mundo deixa de ser realidade quente para se reduzir a marginália, purê de palavras, reflexos no espelho (infiel) do dicionário.
     O que você perde em viver, escrevinhando sobre a vida. Não apenas o sol, mas tudo que ele ilumina. Tudo que se faz sem você, porque com você não é possível contar. Você esperando que os outros vivam para depois comentá-los com a maior cara-de-pau (“com isenção de largo espectro”, como diria a bula, se seus escritos fossem produtos medicinais). Selecionando os retalhos de vida dos outros, para objeto de sua divagação descompromissada. Sereno. Superior. Divino. Sim, como se fosse deus, rei proprietário do universo, que escolhe para o seu jantar de notícias um terremoto, uma revolução, um adultério grego - às vezes nem isso, porque no painel imenso você escolhe só um besouro em campanha para verrumar a madeira. Sim, senhor, que importância a sua: sentado aí, camisa aberta, sandálias, ar condicionado, cafezinho, dando sua opinião sobre a angústia, a revolta, o ridículo, a maluquice dos homens. Esquecido de que é um deles.
     Ah, você participa com palavras? Sua escrita - por hipótese - transforma a cara das coisas, há capítulos da História devidos à sua maneira de ajuntar substantivos, adjetivos, verbos? Mas foram os outros, crédulos, sugestionáveis, que fizeram o acontecimento. Isso de escrever O Capital é uma coisa, derrubar as estruturas, na raça, é outra. E nem sequer você escreveu O Capital. Não é todos os dias que se mete uma idéia na cabeça do próximo, por via gramatical. E a regra situa no mesmo saco escrever e abster-se. Vazio, antes e depois da operação.
     Claro, você aprovou as valentes ações dos outros, sem se dar ao incômodo de praticá-las. Desaprovou as ações nefandas, e dispensou-se de corrigir-lhe os efeitos. Assim é fácil manter a consciência limpa. Eu queria ver sua consciência faiscando de limpeza é na ação, que costuma sujar os dedos e mais alguma coisa. Ao passo que, em sua protegida pessoa, eles apenas se tisnam quando é hora de mudar a fita no carretel.
     E então vem o tédio. De Senhor dos Assuntos, passar a espectador enfastiado de espetáculo. Tantos fatos simultâneos e entrechocantes, o absurdo promovido a regra de jogo, excesso de vibração, dificuldade em abranger a cena com o simples par de olhos e uma fatigada atenção. Tudo se repete na linha do imprevisto, pois ao imprevisto sucede outro, num mecanismo de monotonia... explosiva. Na hora ingrata de escrever, como optar entre as variedades de insólito? E que dizer, que não seja invalidado pelo acontecimento de logo mais, ou de agora mesmo? Que sentir ou ruminar, se não nos concedem tempo para isso entre dois acontecimentos que desabam como meteoritos sobre a mesa? Nem sequer você pode lamentar-se pela incomodidade profissional. Não é redator de boletim político, não é comentarista internacional, colunista especializado, não precisa esgotar os temas, ver mais longe do que o comum, manter-se afiado como a boa peixeira pernambucana. Você é o marginal ameno, sem responsabilidade na instrução ou orientação do público, não há razão para aborrecer-se com os fatos e a leve obrigação de confeitá-los ou temperá-los à sua maneira. Que é isso, rapaz. Entretanto, aí está você, casmurro e indisposto para a tarefa de encher o papel de sinaizinhos pretos. Concluiu que não há assunto, quer dizer: que não há para você, porque ao assunto deve corresponder certo número de sinaizinhos, e você não sabe ir além disso, não corta de verdade a barriga da vida, não revolve os intestinos da vida, fica em sua cadeira, assuntando, assuntando...
     Então hoje não tem crônica.




Não importa a acidez, sempre vale a pena ler Drummond, porque mesmo em autocrítica ele é perfeito.Tem a chave da harmonia entre as palavrase o respeito e a admiração de quem o lê.


Hoje é o dia D...dia de homenagear o poeta que faria 109 anos.


Drummond por ele-mesmo,última entrevista, onde subjaz um quê de mágoa e desilusão:



— Não, eu não me considero um poeta popular, não tenho essa pretensão. Claro que eu gostaria de ser, mas o conceito de poeta popular é muito ligado aos meios de comunicação de massa. Eu não tenho acesso a eles, a televisão jamais me contrataria pra fazer um programa semanal... Ela me chama pra eu dar um depoimento quando faço oitenta anos, ou quando acontece algo relevante. Fora disso eles não me dão a menor importância, os critérios são outros. Agora, se eu fosse um compositor de samba, poderia ser um poeta popular no sentido de que a minha letra seria popular. Se eu fosse o Caetano Veloso, numa noite na televisão eu teria trinta milhões de telespectadores e venderia logo quinhentos mil discos. Essas são as contradições da cultura brasileira — acho que não só da brasileira, não.
(...)... Eu jamais teria uma coisa dessas no lançamento de um livro meu. Vai a televisão me filmar e o repórter pergunta: “Como é, poeta, está vendendo muito? Qual é o nome do seu último livro?”Quer dizer, nem o título do livro eles sabem... 

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Somos na história do universo uma piscadela, um calorzinho entre dois gelos.



“A natureza se realiza em movimento e também nós, seus filhos, que somos o que somos e ao mesmo tempo somos o que fazemos para mudar o que somos. Como dizia Paulo Freire, o educador que morreu aprendendo: “Somos andando”. A verdade está na viagem, não no porto. Não há mais verdade do que a busca da verdade. Estamos condenados ao crime? Bem sabemos que os bichos humanos andamos muito dedicados a devorar o próximo e a devastar o planeta, mas também sabemos que não estaríamos aqui se nossos remotos avós do paleolítico não tivessem sabido adaptar-se à natureza, da qual faziam parte, e não tivessem sido capazes de compartilhar o que colhiam e caçavam. Viva onde viva, viva como viva, viva quando viva, cada pessoa contém muitas pessoas possíveis e é o sistema de poder, que nada tem de eterno, que a cada dia convida para entrar em cena nossos habitantes mais safados, enquanto impede que os outros cresçam e os proíbe de aparecer. Embora estejamos malfeitos, ainda não estamos terminados; e é a aventura de mudar e de mudarmos que faz com que valha a pena esta piscadela que somos na história do universo, este fugaz calorzinho entre dois gelos”.
( os grifos são nossos)
Eduardo Galeano in De Pernas Pro Ar – A Escola do Mundo ao Avesso 


O mundo ao avesso nos ensina a padecer a realidade ao invés de transformá-la, a esquecer o passado ao invés de escutá-lo e a aceitar o futuro ao invés de imaginá-lo: assim pratica o crime, assim o recomenda. Em sua escola, escola do crime, são obrigatórias as aulas de impotência, amnésia e resignação. Mas está visto que não há desgraça sem graça, nem cara que não tenha sua coroa, nem desalento que não busque seu alento. Nem tampouco há escola que não encontre sua contra-escola.”

O mesmo.


Textos para reflexão profunda, para incomodar o espírito, a consciência e  fazer-nos perceber que mudar é difícil, mas - às vezes - essencial. 

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Todos corrompem a alma para atingir bens fugazes..

Ser feliz é, afinal, não esperar muito da felicidade, ser feliz é ser simples, desambicioso, é saber dosear as aspirações até àquela medida que põe o que se deseja ao nosso alcance. Pegando de novo em Tolstoi, que vem sendo em mim um padrão tutelar, lembremos de novo um dos seus heróis, o príncipe Pedro Bezoukhov (do romance 'Guerra e Paz'). As circunstâncias fizeram-no conviver no cativeiro com um símbolo da sabedoria popular, um tal Karataiev. Pois esse companheirismo desinteressado e genuíno, esse encontro com a vida crua mas desmistificadora, não só modificaram o príncipe Pedro como lhe revelaram o que ele precisava de saber para atingir o que nós, pobres humanos, debalde perseguimos: a coerência, a pacificação interior, que são correctivos da desventura.


Tolstoi salienta-nos que Pedro, após essa vivência, apreendera, não pela razão mas por todo o seu ser, que o homem nasceu para a felicidade e que todo o mal provém não da privação mas do supérfluo, e que, enfim, não há grandeza onde não haja verdade e desapego pelo efémero. Isto, aliás, nos é repetido por outra figura de Tolstoi, a princesa Maria, ao acautelar-nos com esta síntese desoladora: «Todos lutam, sofrem e se angustiam, todos corrompem a alma para atingir bens fugazes».


Fernando Namora, in 'Sentados na Relva'
Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo                                                            - mais nada.

Cecília Meirelles.


A vida tem a fugacidade  e a inconstância do vento. Infelizmente, nossa percepção não alcança essa realidade. Saber é insuficiente. O que se faz com o que se sabe, principalmente em relação á vida e á felicidade?Buscar o imponderável talvez seja o destino humano. Uma triste sina.

                      "Viver é muito perigoso" -Guimarães Rosa.









segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Amamos, tão somente,a ideia que fazemos de alguém.



"Nunca amamos alguém. Amamos, tão-somente, a ideia que fazemos de alguém. É a um conceito nosso - em suma, é a nós mesmos - que amamos.
Isto é verdade em toda a escala do amor. No amor sexual buscamos um prazer nosso por intermédio de um corpo estranho. No amor diferente do sexual, buscamos um prazer nosso dado por intermédio de uma idéia nossa. O onanista é objeto, mas, em exata verdade, o onanista é a perfeita expressão lógica do amoroso. É o único que não disfarça nem se engana.

As relações entre uma alma e outra, através de coisas tão incertas e divergentes como as palavras comuns e os gestos que se empreendem, são matéria de estranha complexidade. No próprio ato em que nos conhecemos, nos desconhecemos. 
Dizem os dois "amo-te" ou pensam-no e sentem-no por troca, e cada um quer dizer uma idéia diferente, uma vida diferente, até, porventura, uma cor ou um aroma diferente, na soma abstracta de impressões que constitui a actividade da alma." 


Livro do Desassossego - Bernardo Soares




Mais do mesmo.Eu poderia postar Fernando Pessoa todos os dias até o último da minha vida e sempre estaria dizendo algo precioso, inusitado,imenso. Sinto inefável prazer em lê-lo e partilhá-lo com todos que conseguem ver poesia , mesmo quando ela não há.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Eu desejo impossivelmente o possível...



O que há em mim é sobretudo cansaço -
     Não disto nem daquilo,
     Nem sequer de tudo ou de nada:
     Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
     Cansaço.
    
A sutileza das sensações inúteis,
    As paixões violentas por coisa nenhuma,
    Os amores intensos por o suposto em alguém, 
    Essas coisas todas —
    Essas e o que falta nelas eternamente —;
    Tudo isso faz um cansaço,
    Este cansaço,
    Cansaço. 
   
 Há sem dúvida quem ame o infinito,
    Há sem dúvida quem deseje o impossível,
    Há sem dúvida quem não queira nada —
    Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
    Porque eu amo infinitamente o finito,
    Porque eu desejo impossivelmente o possível,
    Porque quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser, 
    Ou até se não puder ser... 
    
E o resultado?
    Para eles a vida vivida ou sonhada, 
    Para eles o sonho sonhado ou vivido,
    Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto... 
    Para mim só um grande, um profundo,
    E, ah com que felicidade infecundo, cansaço, 
    Um supremíssimo cansaço, 
    Íssimno, íssimo, íssimo,
    Cansaço...

Álvaro de Campos

Se eu tivesse que escolher uma personalidade de Fernando Pessoa, escolheria todas, porque felizmente ele é todos em um.Que maravilha poder partilhar de um universo,no qual esse homem existiu.


Quanto ao cansaço, assim mesmo : de tudo e de nada.É esse,também,o meu cansaço.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Raízes.Preciso delas para viver.



De vez em quando, sem querer, tenho uma aguda consciência do passado. Ele volta em flashes que persistem em permanecer, faz-se presença sólida no ar. Vejo pessoas, ouço vozes, revejo paisagens,sinto odores ou sabores , tenho uma necessidade absurda do “ de novo” ou ainda “ de um pouco mais”, uma vontade estúpida de reter o que já não existe.

Hoje,de maneira incomum, essa sensação me veio por uma música- The Platters entoava “Only You”- em algum lugar distante,o som abafado, mas tão perceptível que mesmo quando a música acabou, continuei a ouvi-la.

Lembrei-me de um amigo de juventude que já se foi.E com ele, vieram lembranças de outros que também partiram cedo demais, gente que fez parte da minha vida e que perdi nas curvas do caminho.Fui assaltada pela sutil percepção de que para eles- e para os que ficamos- a vida passou.

Senti necessidade de vasculhar gavetas de armários, caixas e laçarotes onde papeis amarelados e algumas fotos vivem ainda. Por que teimosamente os guardo? Talvez, se eu me desfizer deles, tenha a impressão de que aqueles momentos não foram reais e palpáveis.São testemunhos.

Esse meu amigo (por algum tempo,mais que isso), revi-o no caótico trânsito de uma tarde , na Avenida Paulista, em São Paulo. O carro dele emparelhou-se com o meu ; primeiro, a surpresa ( depois de tanto tempo! Quase 20 anos...), um sorriso, um aceno de mão e o sinal se abriu. Nenhuma palavra.E nós nos perdemos ali para sempre .Nunca mais nos vimos e quando soube dele há pouco, a notícia era de que ele partira...Apaguei, na hora, inconscientemente a notícia, porque me incomodou e ela voltou -agora-viva e contundente, sob acordes de melodia e letra de um sucesso de ontem.

Poderia ter-lhe perguntado , pelo menos, se ele estava feliz.O que fazia. Se os seus sonhos tinham,alguns deles,se concretizado...Não o fiz. Será que ele teria gostado de ter-me dito algo também? Nunca vou saber...Ficaram apenas um aceno e um silencioso sorriso.

Na verdade,  achamo-nos imortais e deixamos sempre que passem grandes oportunidades de pequenos atos cotidianos. Uma palavra,talvez um abraço, um carinho...Que pena!

É ,foi isso ,amigo. Assim você voltou para mim, hoje.Em notas musicais.E foi bom...e foi bonito, mesmo dolorido.

Quem sabe você não está por aí, ouvindo a mesma música? Quem sabe...

...até um dia!

Valinhos , 19 de junho de 2003.

Não...dessa vez o texto não estava em uma agenda, e sim em um papel cuidadosamente dobrado em uma caixa de fotos antigas, daquelas que transpiram saudades.De quantas dessas preciosidades minha vida é feita? Inúmeras. Raízes...é isso.Preciso delas para viver.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

in Sonhos de uma Noite de Verão.




Há quem diga que todas as noites são de sonhos.
Mas há também quem garanta que nem todas, só as de verão.
Mas no fundo isso não tem muita importância.
O que interessa mesmo não são as noites em si, são os sonhos.
Sonhos que o homem sonha sempre.
Em todos os lugares, em todas as épocas do ano, dormindo ou acordado."


( Shakespeare )



Atemporal.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Seja um professor! Simples assim...


Seja um professor!

Assim mesmo, no imperativo, como se alguém pudesse ordenar (?) a outro a “ tarefa” de ser professor!( não encontrei um verbo adequado para explicar isso).
Explico-me: casualmente, ao garimpar textos para uma aula de redação, deparei-me com esse título no Google e surpresa fiquei ao perceber que era um site do MEC, oficial.
http://sejaumprofessor.mec.gov.br/internas.php?area=como&id=perfil

Até aí, nada demais. Passou pela minha cabeça deixar de vasculhar os tópicos propostos para pesquisa , mas atraída por eles, perfil, incentivo, carreira e outros, deparei-me com requisitos , que transcrevo aqui, "ipsis literis" :

Podem lecionar nos Ensinos Fundamental e Médio das escolas de Educação Básica, os graduados em licenciaturas e Pedagogia. Na Educação Infantil (creches e pré-escolas) e nos quatro primeiros anos do Ensino Fundamental, admitem-se professores com formação mínima de nível médio, na modalidade normal. Porém, o projeto de lei 5.395/09, que tramita no Congresso Nacional, prevê que apenas a Educação Infantil admita professores com formação mínima de nível médio, na modalidade normal.

Para ingressar como professor de qualquer instituto federal, basta apenas a graduação. Entretanto, o plano de carreira prevê uma retribuição por titulação, que aumenta o salário caso o professor tenha mestrado, doutorado ou mesmo especialização.

Os docentes das universidades federais precisam ter ao menos grau de mestre, para concorrerem aos cargos dos concursos, pois atuam especificamente no Ensino Superior. As carreiras das instituições federais também prevêem aumento de salário caso o professor aumente sua titulação.

( os grifos são nossos)
Só isso? São esses os requisitos para ser um professor?Titulação e carreira para aumentar salário?Confesso, fiquei e estou atônita:

Indiscutível que a docência necessita de graduação, competência, habilidades ,como para muitos outros trabalhos, aliás. Mas, professor não pode ser apenas um “ dador” de aulas. 
É preciso doar-se todos os dias, porque para transitar entre seres humanos( não só alunos) em formação é preciso sensibilidade , empenho, abrir-se aos estudos todos os dias, aprender muito mais do que ensinar...É necessário amor, ainda que se considere o baixo salário, a carreira , como, de novo, em qualquer profissão...

Simples assim. Seja um professor! Mostre seus diplomas, seus créditos e transforme-se em um.Será que é isso mesmo? Ou estou absoleta? Creio que não. Convivo com alguns professores excelentes e frustrados por n motivos.
Talvez um dos mais sérios problemas pelos quais passa a Educação no Brasil seja o descaso com que professores são tratados.É surpreendente constatar que os alunos, ao buscarem uma profissão, fogem do magistério porque o consideram “menor” na escala social / profissional.Não percebem que , seja em que profissões escolherem,ou o sucesso/ dinheiro que possuírem, 20 anos depois serão parte de uma família, à procura de uma boa escola para seus filhos. Quem a faz? Não são prédios,paredes,jardins...Não são os apetrechos tecnológicos. Estes só terão funcionalidade se um bom professor estiver por trás deles, complementando-os.

Assim, devo confessar que sou uma advogada que deixou de sê-lo, porque preferiu ser professora – há exatos 45 anos. Em torno de mim,amealhei pessoas( alunos, por um tempo...) e histórias suficientes para preencher livros. Algumas encantadoras, outras comoventes e ainda as muito tristes, mas todas reconhecidas como parte do que já vivi , intangíveis.

Não raro, quando me sinto sozinha ,rememoro alguns fatos ,e sinto-me povoada de pessoinhas adoráveis que passaram por mim, cresceram, sonham, produzem, dedicam-se à inefável aventura de viver e construir a si próprios e o mundo.Então acho que minha vida valeu a pena.

Resumindo : não quero ser nada além do que fui e do que sou, uma professora- ainda!- e apesar de...cujos requisitos vão muito além dos solicitados pelo MEC, graças a Deus!



15 de Outubro : Dia do professor  .

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

O passado tem um rosto...



Estudemos as coisas que já não existem. É necessário conhecê-las, ainda que não seja senão para as evitar. As contrafações do passado tomam nomes falsos e gostam de chamar-se o futuro. Esta alma do outro mundo, o passado, é atreita a falsificar o seu passaporte. Precatemo-nos contra o laço, desconfiemos dela. O passado tem um rosto, que é a superstição, e uma máscara, que é a hipocrisia. Denunciem-lhe o rosto e arranquem-lhe a máscara.
Victor Hugo, in Os Miseráveis


Vivo sempre no presente. O futuro, não o conheço. O passado, já o não tenho. Pesa-me um como a possibilidade de tudo, o outro como a realidade de nada. Não tenho esperanças nem saudades. Conhecendo o que tem sido a minha vida até hoje — tantas vezes e em tanto o contrário do que eu a desejara —, que posso presumir da minha vida de amanhã senão que será o que não presumo, o que não quero, o que me acontece de fora, até através da minha vontade? Nem tenho nada no meu passado que relembre com o desejo inútil de o repetir. Nunca fui senão um vestígio e um simulacro de mim. O meu passado é tudo quanto não consegui ser. Nem as sensações de momentos idos me são saudosas: o que se sente exige o momento; passado este, há um virar de página e a história continua, mas não o texto.
Bernardo Soares in " O Livro do Desassossego"


Gostaria de não ter lembranças, nem saudades...ser um livro de páginas translúcidas que se renovasse a cada dia.Gostaria...