sábado, 19 de fevereiro de 2011
Viver conforme nosso desejo.
'Eu preferiria não o ajudar a ferir outras pessoas, meu amigo, ou a causar a si próprio outras feridas para além daquela que considerar ser o seu paraíso. O rato vive numa toca. É extremamente difícil viver numa toca; pelo menos, os pássaros considerariam que seria um mau paraíso. Por outro lado, a águia sente-se em casa nos picos das montanhas e considera-se a rainha de todos os ventos. Ah, como isso é completamente absurdo, meu amigo!
E os nossos pobres pássaros das charnecas voltam todas as Primaveras à Islândia e partem todos os Outonos voando com aquelas asinhas inúteis sobre o temível oceano. Mas não se pense que o fazem acidentalmente ou à sorte. Não, têm a sua filosofia própria, embora possam ser citadas autoridades para provar que se trata de um ato de loucura. Eu nunca faria isso. Eu defendo que se deveria ajudar todas as criaturas a viver conforme o seu desejo. Mesmo que um rato me dissesse que gostaria de viajar sobre o oceano e que uma águia afirmasse que estava a pensar escavar um buraco no chão, eu diria: Força nisso.
No mínimo deveríamos permitir que os outros vivessem como cada um de nós pretende viver, desde que não os impedíssemos de viver como quisessem viver. Eu sei que é possível provar que tudo correria melhor se fôssemos todos minhocas e se vivêssemos todos no mesmo quintal, mas a águia pura e simplesmente não acredita na verdade, nem o rato. Eu estou tanto do lado da águia que adere a uma doutrina manifestamente falsa, como do lado do rato, que é tão humilde na sua maneira de pensar que escava para si um buraco no chão. Eu sou amigo das aves migratórias, embora, para ser simpático, elas adiram a filosofias dúbias, talvez até mesmo errôneas.'
In Os Peixes Também Sabem Cantar de Halldór Laxness ( Nobel 1955)
O romance, que se situa em inícios do século XX, acompanha a passagem da infância para a vida adulta do jovem Álfgrímur. Abandonado pela mãe em Brekkukot, uma propriedade rural na periferia de Reykjavík – então uma pequena cidade de poucos habitantes e sob o domínio dinamarquês –, a infância de Álfgrímur decorre de forma idílica entre os trabalhos domésticos na quinta, com a avó adotiva que recita os rímur e as antigas sagas islandesas, a aprendizagem de latim e a audição, à noite, das histórias dos excêntricos habitantes de Brekkukot.
Álfgrímur, que sonha um dia tornar-se pescador, tal como o seu avô, vê no entanto todos os seus projectos de futuro serem abalados pelo regresso a casa do Garõar Hólm. Famoso cantor lírico, orgulho da Islândia, a vida de Garõar está porém envolta num misterioso segredo, que caberá a Álfgrímur desvelar, ligando para sempre a sua vida à desta estranha personagem. Será Garõar a fazer com que Álfgrímur se apaixone pela música, incitando-o a alcançar com o canto da sua voz a «Nota Pura».
Ganhei esse livro e-como sempre- estou envolvida nele até o último fio de cabelo...
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Gizelda, que saudades de vir aqui. Que saudades de ler as suas palavras sempre tão sábias e reconfortantes. Linda passagem esta que escolheu. Linda mesmo.
ResponderExcluirTendemos tanto em querer que os outros vivam de acordo com os nossos ideais, que nos esquecemos que somos mais felizes, se vivermos da forma que escolhemos. Porém, às vezes aparece alguém no nosso caminho que sem nos querer mudar, nos influencia com o seu carácter e nos mostra uma possibilidade que ainda não tínhamos ponderado.
Amei cada palavra! Deve ser um livro encantador. Obrigada por o partilhar connosco.
Um grande beijinho :)
Gizelda
ResponderExcluirUma escolha de encanto e a passagem aqui transcrita, é maravilhosa. Um Nobel bem atribuído e eu fiquei com vontade de adquirir o livro!
Mil beijos
Graça
Sinceros parabéns pelo prémio Nobel. Continue envolvida até ao último cabelo naquilo que acredita.
ResponderExcluirSenti sabedoria e sensibilidade no que li neste blog que visito pela 1ª vez.
Prémio merecido por mérito.
Muito suceso e força.
Gostei.
Bjito amigo
Gizelda,
ResponderExcluir"No mínimo deveríamos permitir que os outros vivessem como cada um de nós pretende viver, desde que não os impedíssemos de viver como quisessem viver"
Só esta frase resumo aquilo que levo daqui de forma tão sabiamente escrita. O desafio é semear essas palavras no dia-a-dia e sentirmo-nos plenamente envolvidos pela vida, oferecendo aos outros aquilo que por vezes, por tantos ou nenhuns motivos, fechamos dentro de nós...
Fiquei deliciada com este excerto... mais um diria!
As suas postagens são pérolas, para além de toda a mensagem que encerram, são partilhas únicas e inequivocamente enriquecedoras!
Obrigada, Gizelda!
Beijinho grande!
Querida Helga...
ResponderExcluirReencontrá-la aqui teve um sabor de festa. Fiquei muito feliz com sua presença,mesmo porque vc tem um lugar cativo na minha casa e no meu coração.
Quanto ao texto, eu precisaria viver outra vida para ler todas as preciosidades que tenho encontrado...sem ter tempo para l~e-las.
beijos.
Graça Querida...
ResponderExcluirE não é que você tem razão? A trama é tão original e os costumes são tão diferentes dos nossos que me senti em uma viagem , querendo conhecer mais e melhor.
Beijo.
Oi, Tecas...adorei sua visita e já estou indo retribuí-la.
ResponderExcluirEspero que volte mais vezes e sinta-se bem por aqui.
Beijos.
Querida JB...
ResponderExcluirVou lhe confessar uma coisa : se eu estivesse diante desse livro em uma livraria, não o compraria, porque o título me parecu muito fantasioso.
Mas, alguém que me conhece bem,deu-o a mim e acertou. Fiquei encantada. Acho que há muito para desbravar em literatura.Gostaria de ter tempo e muitoooo dinheiro para comprar estantes inteiras de livros encantados.Prometo que partilharei todos...rs.
Quem sabe, um dia...
Beijinhos, linda. Obrigada.