sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Uma crônica à luz do tempo...




Hoje, 6 de janeiro, enfim, férias.
O meu óbvio quando isso acontece é limpeza e arrumação. É preciso colocar a casa em ordem, para , em seguida,organizar a vida. Não se discute que seria  adorável Paris ou Londres, mas o meu universo não me permite isso nem em divagações.
Bem, como temos que começar por algum lugar, por que não por muitas e muitas prateleiras de livros? Há sempre a chance de unir o prazer ao esforço...

Depois de alguns locais recônditos , onde dormem livros há muito manuseados, tomo às mãos um exemplar de capa colorida que faria o deleite  de muitos adolescentes :pornografia e  lesbianismo. O que ISSO estaria fazendo aqui? Lembro-me , então, não é um exemplar. São dois. Ambos com dedicatória e autografados pela autora.
O tempo borbulha em minha  memória e me leva a parar tudo, sentar-me diante dessa telinha e transcrever  uma situação, no mínimo, constrangedora, vivida por mim em um curso supletivo, São Paulo, capital, em  1970. 40 anos se foram e as imagens fluem diante de mim com uma clareza contundente. Eu tinha, então, 25, era uma jovem advogada em um escritório de Direito do Trabalho( durante o dia) e“aprendiz” de professora à noite.

Redação e Literatura eram as disciplinas que eu acumulara naquele ano. Os fins de semana , eu os passava estudando muito, e me deslumbrava  com os meandros da Língua Portuguesa, aliás, o mesmo que ainda faço. Desde sempre, assim que comecei a ler os clássicos, embora seja amante de todos, tenho um especial : Machado de Assis. Independente da elegância e do estilo precioso, a história dele me motiva e me encanta. E me comprazia em sala de aula, não só a exaltá-lo, mas a criticar a leitura de obras rasteiras que o público adquiria e que, segundo minhas exatas- e imprudentes- palavras , mereciam o lixo. Não raro, minha arrogância ( ah! juventude sem medida!)citava alguns nomes que eu execrava.

Mas, como sempre gostei de estar em sala de aula, e relacionava-me bem com os alunos , para incentivá-los, criei um mural, no qual postava a melhor redação da semana, depois de elogiá-la. Em um dia qualquer, a escolhida  trazia um letra miúda e bonita, e abaixo assinava O. Rios. E foi , então, que conheci Odete, uma jovem senhora ( tinha quase o dobro da minha idade) sorridente,simpática, loira oxigenada, que se apresentou. E não é só, tem mais...
Essa mulher era famosíssima,  Cassandra Rios, a autora que mais vendia livros na época e que, por não ter escolaridade, ali estava atrás de um diploma. Se eu havia citado seus livros como lixo? Sim...mais de uma vez. Constrangimento, vergonha, justificativas, nada adiantou. E  ainda fui presenteada com dois exemplares autografados : “ A Paranóica” e “Macária”. Apesar das dedicatórias elogiosas, as obras me queimavam as mãos. Era como se carregar esses livros fosse algo escandalosos. E era.
Se eu os li? Sim...mais de uma vez. Ela ousou falar em uma linguagem absolutamente crua, com incorreções gramaticais, claro, da sensualidade, do erotismo, do homossexualismo,sem qualquer inibição.

Esses livros ficaram escondidos das minhas filhas durante  todo esse tempo, assim como essa história que me ensinou – levemente, pois isso só se aprende com o tempo- a ser mais comedida.
E como essa ,há muitas história tristes, saborosas,divertidas na minha vida.Há muitos profissionais bem sucedidos e famosos, celebridades televisivas, e outras de quem tenho histórias partilhadas para contar. Mas, estão vivos, vivíssimos, na mídia, e não me cabe desnudá-los aqui.

 Minha filha tem razão... eu poderia escrever um livro!
  
Acreditem...eu fiz parte dessa história.

         Morre em SP a escritora Cassandra Rios

São Paulo - Morreu no dia 08/03/2002 em São Paulo, no hospital Santa Helena, a escritora Cassandra Rios, autora de "A Tara" e "Tessa, a Gata", entre outros. Nascida em 1932 com o nome de Odete Rios, ela foi uma das autoras mais vendidas dos anos 60 e 70 - e também das mais perseguidas pela censura. Estreou com "Volúpia do Pecado" (1948) e foi um sucesso popular com incontáveis livros, ao lado da também considerada pornógrafa Adelaide Carraro (autora de "Adelaide no Mundo com Sílvio Santos").
Chegou a vender quase trezentos mil exemplares de seus livros por ano, números que só seriam rivalizados por Paulo Coelho. Misturava em suas obras homossexualismo feminino, cultos umbandistas, negócios e política, combinação que não respeitava o "bom gosto" que o regime militar desejava preservar. Com a abertura, um de seus livros, "A Paranóica", foi adaptado para o cinema, com título de "Ariella". Ariella (Nicole Puzzi) era uma menina rejeitada que vivia numa mansão e que descobre que seu tio fingia ser seu pai para ficar com sua fortuna. Para se vingar, passa a usar o próprio corpo, desintegrando a família.
Cassandra queixava-se de confundirem suas obras com sua vida. Numa entrevista recente à revista TPM, afirmou: "O que mais me incomodou foi me encararem como personagem de livro. Então, não tenho capacidade para ser escritora?!". Cassandra foi enterrada no cemitério de Santo Amaro (SP).

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