quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Um Natal para sempre.



É indiscutível reconhecer que o Natal me emociona.Gosto da época, do clima, das cores...

Quando a cidade se tinge de verdes e vermelhos e o dourado se confunde com as luzes , sinto uma inefável sensação de prazer. Desempacotar os enfeites cuidadosamente guardados e transformar minha casa em novas cores e  brilhos tem um sabor especial. Mas, enquanto a casa vai se modificando, um lugarzinho da minha alma, de um tempo para cá, permanece inquieto,incomodado.
Definitivamente falta algo, mas o quê?

Eu sei, mas procuro fugir da constatação. Passamos o ano inteiro em “mesas de iguarias de Natal”, ganhamos presentes todos os dias, esquecemo-nos de rezar e agradecer, só sabemos pedir e – o mais triste- a família vai se dispersando.

Na minha infância / adolescência nunca houve ceia. Íamos à Missa do Galo absolutamente encantados com o evento ,com a ansiedade do depois. E...reuniamo-nos diante de um caprichado bolo xadrez  que havíamos “namorado” o dia inteiro, enquanto minha mãe temperava carnes, picava legumes e tudo se transformava em uma mesa- de almoço - onde nada havia sido feito “fora de casa”.

O perfume do cipreste, colhido logo ali, impregnava a casa toda, havia um brilho especial nos olhos, mesmo não entendendo o porquê de nossos Natais serem agraciados com presentes tão simples: uma caixa de bombons,um livro de história...Em 1954 , ganhei um exemplar lindo : A Rainha das Neves ,de Andersen, embora estivesse longe do presente desejado, uma bicicleta que meu pai não pode comprar.

Mesmo que eu possa comprá-la agora, não a quero, quero meu pai, no Natal...mas ele já está encantado,é uma doce lembrança.O tender tem o sabor da presença dele que o apreciava tanto,enquanto para mim tem gosto de papel.

Minha mãe também foi partindo aos pouquinhos diante dos nossos olhos.E se foi , definitivamente há dois anos,levando com ela o melhor da minha história.Depois disso tornou-se impossível " voltar prá casa",aquela que era minha .

Quanto sabia eu da felicidade naquela época? 

Hoje, as filhas chegam com os netos,a alegria ruidosa que eu amo, os amigos (poucos) que restaram não os tenho por perto embora continuem presentes,mas o real é a sensação dolorida de que olhar para minha enfeitada casa não é suficiente.A festa não preenche mais por inteiro meu coração.

Estou feliz pelo que tenho,sim, mas nessa data sinto muito profunda a falta imensa do que se foi e dos que se foram.Talvez seja esse o momento em que a vida dói mais fundo : o Natal.

Definitivamente falta algo que eu nunca vou poder recuperar.E jamais comprar.
O Natal que ficou em minha memória é para sempre...mesmo que não exista mais.

PS : A receita do bolo xadrez permanece intacta, mas os ingredientes principais foram-se ao sabor do tempo:  meus pais.

O bolo,agora, é só uma imagem que não ouso reproduzir.