segunda-feira, 29 de outubro de 2012

O derradeiro mistério somos nós.



As pessoas cujo desejo é unicamente a auto realização, nunca sabem para onde se dirigem. Não podem saber. Numa das acepções da palavra, é obviamente necessário, como o oráculo grego afirmava, conhecermo-nos a nós próprios. É a primeira realização do conhecimento. Mas reconhecer que a alma de um homem é incognoscível é a maior proeza da sabedoria. O derradeiro mistério somos nós próprios. Depois de termos pesado o Sol e medido os passos da Lua e delineado minuciosamente os sete céus, estrela a estrela, restamos ainda nós próprios. Quem poderá calcular a órbita da sua própria alma?
 
Oscar Wilde, De Profundis

Há momentos tão intensos na vida que não sabemos bem se o que dói é o coração ou o cérebro. Na verdade, acho que é alma.

domingo, 28 de outubro de 2012

Não.



Diz NÃO à liberdade que te oferecem, se ela é só a liberdade dos que ta querem oferecer. Porque a liberdade que é tua não passa pelo decreto arbitrário dos outros.

Diz NÃO à ordem das ruas, se ela é só a ordem do terror. Porque ela tem de nascer de ti, da paz da tua consciência, e não há ordem mais perfeita do que a ordem dos cemitérios.

Diz NÃO à cultura com que queiram promover-te, se a cultura for apenas um prolongamento da polícia. Porque a cultura não tem que ver com a ordem policial mas com a inteira liberdade de ti, não é um modo de se descer mas de se subir, não é um luxo de «elitismo», mas um modo de seres humano em toda a tua plenitude.



Diz NÃO até ao pão com que pretendem alimentar-te, se tiveres de pagá-lo com a renúncia de ti mesmo. Porque não há uma só forma de to negarem negando-to, mas infligindo-te como preço a tua humilhação.

Diz NÃO à justiça com que queiram redimir-te, se ela é apenas um modo de se redimir o redentor. Porque ela não passa nunca por um código, antes de passar pela certeza do que tu sabes ser justo.

Diz NÃO à verdade que te pregam, se ela é a mentira com que te ilude o pregador. Porque a verdade tem a face do Sol e não há noite nenhuma que prevaleça enfim contra ela.

Diz NÃO à unidade que te impõem, se ela é apenas essa imposição. Porque a unidade é apenas a necessidade irreprimível de nos reconhecermos irmãos.

Diz NÃO a todo o partido que te queiram pregar, se ele é apenas a promoção de uma ordem de rebanho. Porque sermos todos irmãos não é ordenando-nos em gado sob o comando de um pastor.


Diz NÃO ao ódio e à violência com que te queiram legitimar uma luta fratricida. Porque a justiça há-de nascer de uma consciência iluminada para a verdade e o amor, e o que se semeia no ódio é ódio até ao fim e só dá frutos de sangue.

Diz NÃO mesmo à igualdade, se ela é apenas um modo de te nivelarem pelo mais baixo e não pelo mais alto que existe também em ti. Porque ser igual na miséria e em toda a espécie de degradação não é ser promovido a homem mas despromovido a animal.

E é do NÃO ao que te limita e degrada que tu hás-de construir o SIM da tua dignidade.

in "Contra Corrente" de VERGÍLIO FERREIRA



 A coragem de dizer NÃO é -quase- absoluta. Nós não a temos. Talvez seja aquele SIM que passamos a vida a procurar e nunca encontramos.Ou, se o encontramos, não o assumimos.





quarta-feira, 24 de outubro de 2012

...e por vezes fingimos que lembramos.



E Por vezes...

E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos

E por vezes encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes

ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos

E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos

Davi Mourão Ferreira


Sem mais. 


sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Olhos Vagabundos.



Há muitas pessoas de visão perfeita que nada vêem. "Não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores. Não basta abrir a janela para ver os campos e os rios", escreveu Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa. O ato de ver não é coisa natural. Precisa ser aprendido. Nietzsche sabia disso e afirmou que a primeira tarefa da educação é ensinar a ver. O zen-budismo concorda, e toda a sua espiritualidade é uma busca da experiência chamada "satori", a abertura do "terceiro olho". Não sei se Cummings se inspirava no zen-budismo, mas o fato é que escreveu: "Agora os ouvidos dos meus ouvidos acordaram e agora os olhos dos meus olhos se abriram".

Há um poema no Novo Testamento que relata a caminhada de dois discípulos na companhia de Jesus ressuscitado. Mas eles não o reconheciam. Reconheceram-no subitamente: ao partir do pão, "seus olhos se abriram". Vinicius de Moraes adota o mesmo mote em "Operário em Construção": "De forma que, certo dia, à mesa ao cortar o pão, o operário foi tomado de uma súbita emoção, ao constatar assombrado que tudo naquela mesa - garrafa, prato, facão - era ele quem fazia. Ele, um humilde operário, um operário em construção".
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A diferença se encontra no lugar onde os olhos são guardados. Se os olhos estão na caixa de ferramentas, eles são apenas ferramentas que usamos por sua função prática. Com eles vemos objetos, sinais luminosos, nomes de ruas - e ajustamos a nossa ação. O ver se subordina ao fazer. Isso é necessário. Mas é muito pobre. Os olhos não gozam... Mas, quando os olhos estão na caixa dos brinquedos, eles se transformam em órgãos de prazer: brincam com o que vêem, olham pelo prazer de olhar, querem fazer amor com o mundo.Os olhos que moram na caixa de ferramentas são os olhos dos adultos.
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Os olhos que moram na caixa dos brinquedos, das crianças. Para ter olhos brincalhões, é preciso ter as crianças por nossas mestras. Alberto Caeiro disse haver aprendido a arte de ver com um menininho, Jesus Cristo fugido do céu, tornado outra vez criança, eternamente: "A mim, ensinou-me tudo. Ensinou-me a olhar para as coisas. Aponta-me todas as coisas que há nas flores. Mostra-me como as pedras são engraçadas quando a gente as têm na mão e olha devagar para elas".
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Por isso - porque eu acho que a primeira função da educação é ensinar a ver - eu gostaria de sugerir que se criasse um novo tipo de professor, um professor que nada teria a ensinar, mas que se dedicaria a apontar os assombros que crescem nos desvãos da banalidade cotidiana. Como o Jesus menino do poema de Caeiro. Sua missão seria partejar "olhos vagabundos"...

O texto acima foi extraído da seção "Sinapse", jornal "Folha de S.Paulo", versão on line, publicado em 26/10/2004. 

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

O convívio é o exercito do amor na corda bamba.



O amor é uma escultura que se faz sozinha. É uma flor inesperada sem estação do ano para surgir nem para morrer. Vai sendo esboçada assim ao léu: aqui a sobrancelha se arqueia, ali desce a curva do pescoço, a mão toca a ponta de um pé, no meio estende-se a floresta das mil seduções. 

Imponderável como a obra de arte, o amor nem se define nem se enquadra: é cada vez outro, e novo, embora tão velho. Intemporal. Planta selvagem, precisa de ar para desabrochar mas também se move nos vãos mais escuros, em ambientes sufocantes onde rebrilham os olhos malignos da traição ou da indiferença, e a culpa o pode matar.

 O convívio é o exercito do amor na corda bamba. Os corpos se acomodam, as almas se espreitam, até se complementam. Mas pode-se cair no tédio – sem rede –, e bocejar olhando pela janela. Inventamos receitas para que o amor melhore, perdure, se incendeie e renove... nem murche nem morra. Nenhuma funciona: ele foge de qualquer sensatez, como o perfume das maçãs escapa num cesto de vime tampado.

 Se fossemos sensatos haveríamos de procurar nem amar, amar pouco, amar menos, amar com hora marcada e limites. Mas o amor, que nunca tem juízo, nos prega peças quando e onde menos esperamos. Nunca nos sentimos tão inteiros como nesses primeiros tempos em que estamos fragmentados: tirados de nós mesmos e esvaziados de tudo o mais, plenos só do outro em nós. 

Nos sentimos melhores, mais bonitos, andamos com mais elegância, amamos mais os amigos, todo mundo foi perdoados, nosso coração é um barco para o qual até naufragar seria glorioso (ah, que naufrágios...). Mais que isso, nesse castelo – como em qualquer castelo – não pode haver dois reis. Quem então cederá seu lugar, quem será sábio, quem se fará gueixa submissa ou servo feliz, para que o outro tome o lugar e se entronize e... reine?

 A palavra “liberdade” teria de ser mais presente, porém é mais convidada a discretamente afastar-se e permitir que em seu lugar assuma o comando alguma subalterna: tolerância, resignação, doação, adaptação. Rondando o fosso do castelo, a vilã de todas ,a culpa.

 Quem deixou sobre minha mesa o bilhete dizendo “se você ama alguém, deixe-o livre” sabia das coisas, portanto sabia também o desafio que me lançava. No mundo das palavras há tantos artifícios quantas são as nossas contradições. Por isso, conviver é tramar, trançar, largar, pegar, perder. E nunca definitivamente entender o que – se fossemos um pouco sábios – deveríamos fazer. Farsa, tragédia grega, outras soneto perfeito: o amor, com as palavras, se disfarça em doces armadilhas ou lâminas.

 Lya Luft

Quem nunca se sentiu assim, não viveu.Sofrer  por amor é deliciosa regra, não exceção.
Esse texto é para uma pessoa especial que me fez sentir tudo isso. Perdi sua presença nos  nos desvãos da vida,mas o que foi vivido não se perdeu jamais. Que essas palavras reverberem no infinito e o abracem no seu aniversário!

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Mensagem de um professor.


Replay...


A Lei do Palhaço.


"Conta certa história que numa determinada cidade apareceu um circo. Entre os seus artistas havia um palhaço, com um poder de divertir, sem medida, as pessoas da platéia. O riso que provocava era tão bom, tão profundo e natural que se tornava terapêutico. 
Todos os que padeciam de tristezas agudas ou crônicas passaram a ser indicados pelo médico do lugar para que assistissem ao tal artista, que ele mesmo tinha visto atuar e que possuía o dom de fazer reduzir ou até mesmo eliminar angústias.

Um dia, porém, um morador desconhecido, tomado de profunda depressão, procurou o médico. Este então, sem relutar, indicou o circo como o lugar de cura de todos os males daquela natureza, de abrandamento de dores da alma, de iluminação de todos os cantos escuros de um "jeito perdido" de ser, de tristezas com ou sem causa. O homem nada disse, levantou-se, caminhou em direção à porta e quando já estava saindo, virou-se, olhou o médico nos olhos e sentenciou: 

"Não posso procurar o circo... aí está o meu problema: eu sou o palhaço!".

Como professor vejo que, muitas vezes, sou esse palhaço, alguém que trabalhou para construir os outros e não vê resultado muito claro daquilo que fez e faz. Tenho a impressão que ensino no vazio (e sei que não estou só nesse sentimento) porque depois de formados, meus ex-alunos parecem se acostumar rapidamente com aquele mundo de iniquidades que combatíamos. Parece que quando meus meninos(as) caem no mercado de trabalho, a única coisa que importa é quanto cada um vai lucrar, não importando quem vai pagar essa conta e nem se alguém vai ser lesado nesse processo. Aprenderam rindo, mas não querem passar o riso à frente e nem se comovem com o choro alheio.

Digo isso, até em tom de desabafo, porque vejo que cada dia mais meus alunos se gabam de desonestidades. Os que passam os outros para trás são heróis e os que protestam são otários, idiotas ou excluídos. É uma total inversão de virtudes, de conceitos... Vejo, encabulado, que alguns "professores" partilham daquelas mesmas idéias "modernas", defendem-nas em sala de aula e na sala de professores 
e chegam até a se vangloriar disso. Essa ideia vem me assustando cada vez mais, desde que repreendi, numa conversa com alunos, o comportamento do cantor Zeca Pagodinho, no episódio da guerra das cervejas, e quase todos disseram que o cantor estava certo, tontos foram os que confiaram nele!

"O importante, professor, é que o cara embolsou milhões", disse-me um; outro: "daqui a pouco ninguém lembra mais... no Brasil é assim, e ele vai continuar sendo o Pagodinho, só que um pouco mais rico". Todos se entreolharam e riram; só eu, bobo que sou, fiquei sem graça. 

O pior é que a gente se dá conta que no Brasil é assim mesmo, o que vale é a lei de Gérson: "o importante é levar vantagem em tudo". (Lei de Gérson... dá para rir...)

A pergunta é: é possível, pela lógica, que todo mundo ganhe? Para alguém ganhar é óbvio que alguém tem de perder? 

A "lógica" que rola solta por aí - ao que tudo está a indicar - é guardar o troco a mais recebido no caixa do supermercado; é enrolar a aula fingindo que a matéria está sendo dada; é fingir que a apostila está aberta na matéria dada, mas usá-la como apoio enquanto se joga batalha naval, jogo da velha ou alguma outra coisa; é cortar a fila do cinema ou da entrada do show; é dizer que leu o livro, quando se ficou só no resumo (feito por outrem, geralmente )- ou na conversa com quem leu; é marcar só o gabarito, copiado do vizinho, prova em branco, alegando que "fez as contas de cabeça" ou que "tava na ponta da língüa"; é comprar na feira uma dúzia de quinze laranjas; é bater num carro parado e sair rápido, antes que alguém perceba; é brigar para baixar o preço mínimo das refeições nos restaurantes universitários, para sobrar mais dinheiro para a cerveja da tarde ou a balada da noite; é arrancar as páginas ou escrever nos livros das bibliotecas públicas; é arrancar placas de trânsito e colocá-las de enfeite no quarto; é trocar o voto por facilidades, empregos ou algo que se traduza em "algum"; é fraudar propaganda política mostrando ser ou ter realizado aquilo que nunca se foi ou que jamais se fez(assim como tantas duplas sertanejas, esta, Lula e Duda, incluída).

É a lógica da perpetuação da burrice. Quando um país perde, todo mundo perde. 

E não adianta pensar que logo bateremos no fundo do poço, porque o poço não tem fundo.Parafraseando Schopenhauer: "Não há nada tão desgraçado na vida da gente que ainda não possa ficar pior".
Se os desonestos brasileiros voassem, nós nunca veríamos o sol.

Felizmente há os descontentes, os lutadores, os sonhadores, os que querem manter o sol aceso, brilhando e no alto.A luz é e sempre foi a metáfora da inteligência. 

No entanto, de nada adianta o conhecimento sem o caráter.Que nas escolas seja tão importante ensinar Literatura, Matemática, História, Biologia e Educação Física quanto decência, senso de coletividade, coleguismo e respeito por si e pelos outros.

Acho que o mundo (e, sobretudo, o Brasil) hoje está a precisar mais de gente e de gente honesta do que de literatos, historiadores ou matemáticos.Ou o Brasil encontra e defende essas dignidades e abomina Zecas, Gérsons, Dirceus, Dudas (e todos os marqueteiros de eterno plantão para se darem bem), esses que chamam desonestidades flagrantes de "espertezas técnicas", ou o Brasil passa de "país do futebol mas de futuro" para "país do futefuro". Zipado e compacto.

De um Presidente da República espera-se mais do que choro e condecoração a garis honestos, espera-se honestidade em forma de trabalho e transparência. De professores, espera-se mais que discurso de bons modos, espera-se que mereçam o salário que ganham (pouco ou muito) agindo como quem é honesto. Sobretudo agindo como educadores, vendo no próximo, no jovem à sua frente, alguém como um filho seu que tivesse nascido em outro lar. 

A honestidade não precisa de propaganda, nem de homenagens, precisa de exemplos. 
Quem plantar joio, jamais colherá trigo. 

Quando reflexões assim são feitas, cada um de nós se sente o palhaço perdido no palco das ilusões. A gente se sente vendendo o que não pode viver, não porque não mereça, mas porque não há ambiente para isso. 
Quando seria de se esperar uma vaia coletiva pelo tombo, pelo golpe dado na decência, na coerência, na credibilidade, no senso de respeito, vemos a população em coro delirante gritando "bis" e, como todos sabemos, um bis não se despreza. 

Então, uma pirueta, duas piruetas, bravo! bravo! 
E vamos todos rindo e afinando o coro do "se eu livrar a minha cara, o resto que se dane”. 

Enquanto isso o Brasil de irmã Dulce, de Manuel Bandeira, do Betinho, de Clarice Lispector, de Chiquinha Gonzaga e de muitos outros heróis e heroínas,anônimos que diminuíram a dor desse país com a sua obra, levanta-se, caminha em silêncio até a porta, vira-se e diz: "Esse é o problema... 

eu sou o palhaço".

O original deste texto foi enviado por:
Prof. Sílvio Camerino P. Barreto.
(Solar Camerino - Recife - Pernambuco)


Esse texto já foi publicado aqui há  anos atrás, mas é tão significativo que quero oferecê-lo a todos aqueles que  formam um exército anônimo em uma luta diuturna para que o país melhore, para que o mundo melhore- os professores por idealismo , os sonhadores, os que acreditam que o BRASIL  E O MUNDO SÓ TEM SAÍDA PELA EDUCAÇÃO.

Feliz Dia do Professor.

sábado, 13 de outubro de 2012

Quanto vale uma mulher?



Um post fora de tom...

Não é habito desse blog comentar fatos cotidianos, uma vez que as publicações da mídia o fazem , perfeitamente. Mas, às vezes, as entrelinhas falam mais que o texto. E é sobre elas esse post.

Não me considero moralista, costumo fazer julgamentos silenciosos sobre o que me incomoda, mas , hoje, fui desafiada diante de uma manchete do UOL e um posterior texto o qual transcrevo na íntegra.


13/10/201207h40
Leilão da virgindade de brasileira se aproxima do fim com disputa acirrada.
 Renan Antunes de Oliveira
Do UOL, em Florianópolis (SC)

Dois homens, um indiano e um americano disputam dólar a dólar a virgindade de Catarina. O leilão por Ingrid Migliorini, nome verdadeiro da garota de 20 anos, encerra-se às 11h de domingo, horário de Brasília, e Jack Miller, dos EUA, superou pela terceira vez a oferta de Rubra Chatterjee.
A real identidade deles é desconhecida. Chatterjee oferecera 250 mil dólares (R$ 500 mil) no domingo (7), porém Miller aumentou para 255 mil dólares (R$ 510 mil) a oferta por ela. Entre os 13 inscritos, os dois são os mais insistentes, alternando-se no topo da lista desde os 150 mil dólares (R$ 300mil).
Catarina é o pseudônimo de, uma catarinense de 20 anos. O leilão da virgindade é um reality show australiano. Ela se candidatou ao show pela internet.
A ousadia dos promotores aumenta na reta final. Agora eles exibem uma foto de Catarina nua no site, enquanto na anterior ela vestia uma blusinha de renda branca. Não se sabe até quanto os competidores podem pagar, nem existem garantias de que o vencedor pague. Os promotores ameaçam processar os autores de propostas frias.
A garota está em Bali, na Indonésia, participando de gravações do programa, enquanto espera visto para entrar na Austrália - pelo regulamento do leilão, ela terá que voar de lá para os Estados Unidos.
O ganhador terá sete dias para fazer o pagamento. Todo dinheiro será da virgem. Ela vai receber adiantado. Os produtores ganham vendendo o show para TV. As imagens com Catarina ainda virgem vão terminar no momento em que ela entrar no avião com o ganhador.
No dia 25, Catarina terá que entregar-se ao vencedor, num voo entre a Austrália e EUA, levando um atestado de virgindade. Caso o ganhador não pague no prazo, será desqualificado. Catarina será entregue a quem tiver dado o maior lance válido - e ele terá uma hora de prazo para consumar o ato. Entre os 13 inscritos no leilão, alguém que se identificou apenas como Lucas Zaiden deu lance de apenas um dólar (R$ 2). Caso todos desistam, Catarina será dele.
O jovem russo Alexander, de 23 anos, também está em leilão. A maior oferta por ele é de R$ 2 mil 600, feita por um brasileiro, ou brasileira, que assina Anahi Stephan.
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Não acredito em nenhum momento que o maior valor de uma mulher seja a virgindade.Nem posso crer que o valor de um homem esteja no poder financeiro e na vaidade de desembolsar tanto dinheiro pelo prazer de deflorar uma mulher, em especial, publicamente.

Olho para o rosto bonito dessa menina e me pergunto se isso a fará feliz. Atrás do que ela se lança com essa atitude : dinheiro, fama ? E depois?

O que fica desse episódio  são os valores morais invertidos dos quais a sociedade se alimenta : dinheiro, fama e poder. Lamentavelmente , a notoriedade pode custar bem mais caro do que parece. 

Olho mais uma vez o rostinho que me olha da foto e tenho pena dessa exposição.

...não  tenho dúvida de que esse poderia ser um tema propício e reflexivo para as redações de vestibulares do fim do ano que se aproxima.

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

...tudo é questão de despertar a alma.




(...)


“Remédios, a bela, foi a única a permanecer imune à epidemia das bananeiras. Deteve-se numa adolescência magnífica, cada vez mais impermeável aos formalismos, mais indiferente à malícia e à desconfiança, feliz num mundo próprio de realidades simples. Não percebia por que razão as mulheres complicavam a vida com corpetes e saiotes, de modo que coseu um balandrau de canhamaço que enfiava simplesmente pela cabeça e resolvia sem mais delongas o problema de se vestir, sem lhe tirar a impressão de estar nua, que era na sua maneira de ver as coisas, a única forma decente de estar em casa. Aborreceram-na tanto para que cortasse o cabelo e para que fizesse carrapitos com travessas e tranças com laços coloridos, que muito simplesmente rapou a cabeça e fez perucas para santos. O que era espantoso no seu instinto simplificador era que quanto mais se desembaraçava da moda em busca da comodidade, quanto mais passava por cima dos convencionalismos obedecendo à espontaneidade, mais perturbadora se tornava a sua beleza incrível e mais provocador o seu comportamento com os homens.”
(,,,)
"As coisas têm vida própria", apregoava o cigano com áspero sotaque, "tudo é questão de despertar a sua alma." José Arcadio Buendía, cuja desatada imaginação ia sempre mais longe que o engenho da natureza, e até mesmo além do milagre e da magia, pensou que era possível se servir daquela invenção inútil para desentranhar o ouro da terra.
A única coisa que conseguiu desenterrar foi uma armadura do século xv, com todas as suas partes soldadas por uma camada de óxido, cujo interior tinha a ressonância oca de uma enorme cabaça cheia de pedras. Quando José Arcadio Buendía e os quatro homens da sua expedição conseguiram desarticular a armadura, encontraram dentro um esqueleto calcificado que trazia pendurado no pescoço um relicário de cobre com um cacho de cabelo de mulher."
(...)
“O Coronel Aureliano Buendía arranhou durante muitas horas, tentando rompê-la, a dura casca da sua solidão. Os seus únicos momentos felizes, desde a tarde remota em que seu pai o levara para conhecer o gelo, haviam transcorrido na oficina de ourivesaria, onde passava o tempo armando peixinhos de ouro. Tivera que promover 32 guerras, e tivera que violar todos os seus pactos com a morte e fuçar como um porco na estrumeira da glória, para descobrir com quase quarenta anos de atraso os privilégios da simplicidade”.


In "Cem Anos de Solidão" ( excertos) - 
Gabriel Garcia Marquéz

Em um lugar encantado chamado Macondo...
Cem anos de solidão  são enfrentados por  personagens cheios de amor e coragem mas que não escapam do vazio, da inquietude da vida e dos mistérios que ela traz.
Uma epopeia de magia e sentimento.
Simplesmente imperdível. 

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

A paixão, como certas tempestades, acontece.



VARIAÇÕES EM TORNO DA PAIXÃO

Paixão é a alucinação amorosa. E os apaixonados são de duas espécies: os generosos, que se dão inteiramente, se  jogando  estabanadamente  nas  mãos  do outro,  e  os  possessivos,  que querem que o outro se incorpore a eles convertidos em sombra viva. Mas talvez haja um terceiro tipo: o dos que não se apaixonam, mas despertam paixões. Na impossibilidade ou no medo de se apaixonar, posto que paixão é abismo, alimentam-se da paixão alheia, ou melhor, incentivam a paixão em torno para preencher algo em si.
Paixão, por isto é arma de dois ou três gumes. E corta. E sangra. Se não sangrou, se não teve insônia, se não desesperou, se não ficou com a alma dependurada num fio de telefone, se não ficou exposto na úmida espera, paixão não era.
Talvez fosse desejo, que o desejo é diferente. No desejo a gente quer o outro para possuí-lo apenas passageiramente. É como se fosse um apetite despertado por um fruto ou alguma comida saborosa que saliva nossos sentidos. É como se fosse possuir um objeto na vitrina. É um desejo de posse natural, estético, erótico, mas sendo mais desejo que qualquer outra coisa, isto vai passar.E passa.
Na paixão, não. Na paixão, a gente quer se fundir com o outro.  Para sempre.  De corpo e alma.  Perde totalmente o centro de gravidade.  Transfere a moradia de seu ser para a casa do ser alheio.  É como se vestisse a pele do outro.  E se o outro disser assim: “Vai ali buscar aquela estrela ou mesmo a Lua” (como naquele lindo conto de Murilo Rubião chamado Bárbara), se o outro disser isto, a gente vai airosamente buscar o que ele quer.
E se o outro disser: “Não estou gostando de seu nariz”, a gente opera, corta, joga fora, não só o nariz, mas qualquer outra coisa, porque, nesse caso, qualquer palavra ou sugestão é ordem.
A paixão é boa?A paixão é ruim?
Ninguém sabe. Ela acontece. Como certas tempestades, ela acontece. Assim como depois dos vendavais os elementos da natureza já não são os mesmos, ninguém será o que era depois do desvario da paixão. Vidas renascem com paixões. Outras viram cinzas por causa dela. E há pessoas que são como aquela ave mítica — a Fênix, vivem renascendo das cinzas da paixão.
Marx, portanto, errou completamente.  Não é a luta de classes que move a história,  é a paixão.  Paixão é a revolução a dois.  Ela desafia o sistema.  Diante  dela   a  comunidade   fica abalada.  A paixão é anti-social   e   egoísta,   no   que   é   diferente   do   amor  maduro,   longo   e duradouro,  que  fecunda a vida dos amantes e reforça os laços da comunidade. Com Romeu e Julieta, por exemplo, fez-se a revolução a dois. Foi assim com Tristão e Isolda, com Genevieve e Lancelot.                   Não é de hoje.
Affonso Romano de Sant’ana
Ninguém deveria morrer sem ter vivido uma paixão. A dor, quando ela acaba, é infinitamente menor do a sensação alucinada de tê-la vivido." ,,,é fogo que arde sem se ver".

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Qualquer coisa no mundo se entristece quando se perdem um ao outro.



Dava raiva, porque se tinham amado tanto e de formas tão diversas durante os duzentos anos em que já se conheciam que era uma pena separarem-se assim, como se nada fosse.
Duzentos anos, dizia ela, porque com o tempo adquiriu a certeza de que assim fora. A sua fé no absoluto era tão estranha que ia pegando em coisas de todas as religiões que tinha à mão, e aquilo das várias vidas, das almas jovens e das almas velhas, agradou-lhe desde que o referiram como uma verdade tecida com fios de prata.
Não hesitou em agarrar-se à certeza de que se conheciam há tantos anos que não lhes era possível recordar. Ter-se-iam visto seguramente pela primeira vez, pensava, em 1754, provavelmente em Valência, e uma outra vez ou muitas durante o século XIX, a meio de uma guerra ou num baile, mas o encontro de 1967, em que se cruzaram numas escadas mesmo no centro da cidade de Puebla, marcou-os positiva e definitivamente, embora como das outras vezes estivesse tudo prestes a acabar mal.
Quem sabe porque a vida coloca armadilhas àqueles que, vistos de fora, não podem ser mais do que um casal para o resto das suas vidas, mas diz-se que isso acontece e está visto que não só eles, mas qualquer coisa no mundo se entristece quando se perdem um ao outro.
No século XX, Ana García e Juan Icaza, grandes nomes da pequena cidade, tornaram-se namorados desde o instante em que aquela escada os submeteu ao seu feitiço. Ela ia a subir e ele vinha a descer quando o ar se cruzou entre eles e o perfume atravessou as suas roupas. Ela trazia um vestido branco, estava calor. Ele tinha na mão um chapéu cordovês, fazendo com que qualquer um pensasse que ia ou vinha de uma praça de touros.
Aí e naquele tempo era ainda o homem quem iniciava a corte e ele demorou meio minuto a iniciá-la. Perguntou-lhe se era filha do seu pai e contou-lhe que fazia os fios com que o bom senhor tecia os seus panos. Disse-lhe que parecia uma pomba da paz e ela sorriu dizendo que as pombas estão sempre em guerra, que não havia campanário ou praça que desse fé de outra coisa e que nenhuma mulher vestida de branco podia ser de grande confiança.
Dizem as histórias que a ironia não é útil para falar com os homens, mas ela esqueceu-se e, irremediavelmente, deixou escapar alguma. Desde esse momento e para sempre, o relacionamento entre eles teria os seus altos e os seus baixos sempre que Ana ironizava acerca do irremediável. Por exemplo, da paixão de Juan por si próprio, da sua língua comprida, da sua vaidade sem estorvos, do seu aspecto de bêbado empedernido.
Foram namorados durante uns tempos. Namorados daqueles que acabam a despedir-se à porta de casa, quando o encontro deveria começar.
Depois de uma dessas despedidas, ele foi beber com os amigos, e de beber a namoriscar com uma ruiva decorreu um segundo. No dia seguinte, meia cidade acordou contando que Icaza tinha dançado com uma gringa, colado a ela como uma etiqueta.
– Eu estava bêbado – disse ele para se desculpar.
– Ainda pior – respondeu-lhe Ana, afastando-se do abraço que não dariam.
Essa madrugada, e as trinta que se seguiram, Juan passou-as a cantar sob a exótica varanda de Ana, que se fingia surda enquanto toda a família se aborrecia por não o ser. Acompanhava-o um mariachi que conhecia de trás para a frente todas as canções que têm pombas traidoras em alguns dos seus versos. Sem falar da pomba negra, da pomba querida, da pomba que chega a uma janela e da que nunca lá chega, da pomba em cujos braços alguém viveu a história de amor que nunca sonhou, da pomba que sabe que o despedaça se no dia de amanhã perde a fé nele.

In Maridos / Angeles Mastretta.

Contos curtos e sensíveis
.Amor,felicidade,sonhos, frustração, traição, separações...afinal ,não é disso que a vida é feita?


segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Quanto vale qualquer afeto que espera recompensa?



Dois amigos, inseparáveis na juventude, reencontram-se 40 anos depois.

“ A amizade, pensava eu – e tu, que andaste mais pelo mundo fora, certamente sabes mais e melhor que eu, aqui na minha solidão campestre - , é a relação humana mais nobre que pode haver entre os seres vivos humanos. É curioso, os animais conhecem-na bem também. Existe amizade, altruísmo, solidariedade entre os animais. Um príncipe russo escreveu sobre isso… já não me lembro do nome dele. Há leões e galos bravos, criaturas de todo o gênero que tentam socorrer os da sua espécie que se vêem em apuros, sim, vi com os meus próprios olhos que, às vezes, ajudam também aos animais de outra espécie. (…).
Entre pessoas, vi menos exemplos. Para ser mais exacto, não vi nenhum. As simpatias que vi nascer entre pessoas diante dos meus olhos, acabaram sempre por se afogar nos pântanos do egoísmo e da vaidade. A camaradagem, o companheirismo, às vezes, parecem amizade. Os interesses comuns por vezes criam situações humanas que são semelhantes à amizade. 


E as pessoas fogem da solidão, entrando em todo o tipo de intimidades de que, a maior parte das vezes, se arrependem, mas durante algum tempo podem estar convencidas de que essa intimidade é uma espécie de amizade. Naturalmente, nesses casos não se trata de verdadeira amizade. Uma pessoa imagina – e o meu pai entendia as coisas dessa maneira – que a amizade é um serviço. O amigo, assim como o namorado, não espera recompensa pelos seus sentimentos. Não quer contrapartidas, não considera a pessoa que escolheu para ser seu amigo como uma criatura irreal, conhece os seus defeitos e assim o aceita, com todas as suas consequências. Isso seria o ideal. 

E na verdade, vale a pena viver, ser homem, sem esse ideal? E se um amigo falha, porque não é um verdadeiro amigo, podemos acusá-lo, culpando o seu caráter, a sua fraqueza? Quando vale aquela amizade, em que só amamos o outro pela sua virtude, fidelidade e perseverança? Quanto vale qualquer afeto que espera recompensa? Não seria nosso dever aceitar o amigo infiel da mesma maneira que o amigo abnegado e fiel? Não seria isso o verdadeiro conteúdo de todas as relações humanas, esse altruísmo que não quer nada nem espera nada, absolutamente nada do outro? E quanto mais dá, menos espera em troca?(…)
Vês, dediquei-me a essas questões teóricas quando fiquei sozinho. Naturalmente, a solidão não me deu resposta. Nem os livros deram resposta perfeita. Nem os livros antigos, os estudos dos pensadores chineses, hebreus e latinos, nem os modernos que falam sem rodeios, mas dizem sobretudo palavras e não a verdade.

In: As Velas Ardem até ao Fim, Sándor Márai, Dom Quichote, 2006

 Palavras... talvez  a amizade seja antes uma palavra do que uma relação de afeto.Há um fundo inquestionável de verdade nesse texto e nessa magnífica obra.