quinta-feira, 28 de abril de 2011

Muito Guimarães Rosa para pouca vida.

Todos os meus livros são simples tentativas de rodear e devassar um pouquinho o mistério cósmico, esta coisa movente, impossível, perturbante, rebelde a qualquer lógica, que é a chamada realidade, que é a gente mesmo, o mundo, a vida. Antes o obscuro que o óbvio, que o frouxo. Toda lógica contém inevitável dose de mistificação. Toda mistificação contém boa dose de inevitável verdade, precisamos também do obscuro.

Quando escrevo, repito o que já vivi antes. E para estas duas vidas, um léxico só não é suficiente. Em outras palavras, gostaria de ser um crocodilo vivendo no rio São Francisco. Gostaria de ser um crocodilo porque amo os grandes rios, pois são profundos como a alma de um homem. Na superfície são muito vivazes e claros, mas nas profundezas são tranquilos e escuros como o sofrimento dos homens.

Que nasci no ano de 1908, você já sabe. Você não deveria me pedir mais dados numéricos. Minha biografia, sobretudo minha biografia literária, não deveria ser crucificada em anos. As aventuras não têm princípio nem fim. E meus livros são aventuras; para mim são minha maior aventura.


"A beleza aqui é como se a gente a bebesse, em copo, taça, longos, preciosos goles servida por Deus. É de pensar que também há um direito à beleza, que dar beleza a quem tem fome de beleza é também um dever cristão."
Grande Sertão: Veredas

"...a gente morre é para provar que viveu."


"Quanto mais ando, querendo pessoas, parece que entro mais no sozinho do vago..." - foi o que pensei na ocasião. De pensar assim me desvalendo. Eu tinha culpa de tudo, na minha vida, e não sabia como não ter. Apertou em mim aquela tristeza, da pior de todas, que é a sem razão de motivo; que, quando notei que estava com dor-de-cabeça, e achei que por certo a tristeza vinha era daquilo, isso até me serviu de bom consolo. E eu nem sabia mais o montante que queria, nem aonde eu extenso ia.
Grande Sertão:Veredas

"Eu ando meio febril, repleto, com um enxame de personagens a pedirem pouso em papel. É coisa dura e já me assusta, antes de pôr o pé no caminho penoso, que já conheço".


"Mãe, que é que é o mar, mãe?
Mar era longe, muito longe dali, espécie de lagoa enorme, um mundo d'água sem fim. Mãe mesma nunca tinha avistado o mar, suspirava. 'Pois mãe, então o mar é o que a gente tem saudade?'
Campo Geral

"Eu passei dois anos num túnel, um subterrâneo, só escrevendo, só escrevendo eternamente. Foi uma experiência transpsíquica, eu me sentia um espírito sem corpo, desencarnado - só lucidez e angústia"


" O sertão é do tamanho do mundo"

" A inspiração é uma espécie de transe.
Só escrevo atuado, em estado de transe..."


"As pessoas não morrem, ficam encantadas".

"Sim, fui médico, rebelde, soldado. Foram etapas importantes de minha vida, e, a rigor, esta sucessão constitui um paradoxo. Como médico, conheci o valor do sofrimento; como rebelde, o valor da consciência; como soldado, o valor da proximidade da morte." Guimarães Rosa.

DEUS EXISTE MESMO QUANDO NÃO HÁ. MAS O DIABO NÃO PRECISA DE HAVER PARA EXISTIR.
Comigo as coisas não tem hoje e ant’ontem amanhã: é sempre. (...) O senhor por ora mal me entende, se é que no fim me entenderá. Mas a vida não é entendível.” (Grande Sertão: Veredas)

Falo: português, alemão, francês, inglês, espanhol, italiano, esperanto, um pouco de russo; leio: sueco, holandês, latim e grego (mas com o dicionário agarrado); entendo alguns dialetos alemães; estudei a gramática: do húngaro, do árabe, do sânscrito, do lituânio, do polonês, do tupi, do hebraico, do japonês, do checo, do finlandês, do dinamarquês; bisbilhotei um pouco a respeito de outras. Mas tudo mal. E acho que estudar o espírito e o mecanismo de outras línguas ajuda muito à compreensão mais profunda do idioma nacional. Principalmente, porém, estudando-se por divertimento, gosto e distração.

A língua e eu somos um casal de amantes que juntos procriam apaixonadamente, mas a quem até hoje foi negada a benção eclesiástica e científica. Entretanto, como sou sertanejo, a falta de tais formalidades não me preocupa. Minha amante é mais importante para mim.

Amo a língua, realmente a amo como se ama uma pessoa. Isto é importante, pois sem esse amor pessoal, por assim dizer, não funciona.

Quando escrevo, repito o que já vivi antes. E para estas duas vidas, um léxico só não é suficiente.
Não gosto do transitório, do provisório. Gosto do Eterno...

O senhor....Mire veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior, É o que a vida me ensinou.”

Cada dia é um dia. ...”Vida” é noção que a gente completa seguida assim, mas só por lei duma idéia falsa. Cada dia é um dia.

“Cada palavra é, segundo sua essência, um poema".

Pense só em sua gênese. No dia em que completar cem anos, publicarei um livro, meu romance mais importante: um dicionário. (...) E este fará as vezes de minha biografia.

GUIMARÃES ROSA



Há momentos em que a vida nos prega peças de mau gosto e nem sempre conseguimos suportá-las.Ficamos , então, soltos no espaço, flutuando, à espera de uma chance de pouso.

É isso.Estou tentando pousar...

3 comentários:

  1. Giselda,
    Este é um post para ler e reler. Encantei-me. Voltarei, depois, com mais calma.

    Beijo :)

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  2. Eu vivo encantada com G.Rosa...quando o leio percebo que o melhor ainda está nas entrelinhas.

    Beijos, AC.

    Volte sempre. É prazeroso tê-lo aqui.

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  3. Gizelda,
    concordo com o AC.
    amei :
    "As pessoas não morrem, ficam encantadas".~
    _________
    Li pouco Guimarães Rosa...tenho que ler +. quais os livros dele que acha 'obrigatório' ler-se. beijo

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