quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

O saco de brinquedos do amor.

Para aperfeiçoar o casamento e torná-lo mais feliz, nossos legisladores criaram o casamento com separação de bens. Mas falta ainda um passo para que a felicidade dos cônjuges seja completa: a criação do casamento com separação de males.

 Meu pai me contou que, quando era menino, no início do século passado, guardava seus brinquedos num saco. Os brinquedos que meu pai menino guardava no saco: latas vazias, pedaços de barbante, sementes, sabugos de milho, botões, pedaços de pau, pedrinhas e todo tipo de coisas inúteis. Quando alguém aparecia para visitar minha avó ele pegava o saco de brinquedos e o esvaziava diante da visita. Certamente achava seus brinquedos interessantíssimos! A mãe dele ficava furiosa e lhe aplicava o devido corretivo de chineladas depois que a visita ia embora. A chinela era um dos itens favoritos que minha avó guardava no saco de brinquedos dela.
As crianças continuam as mesmas. Ainda gostam de mostrar brinquedos. A gente cresce e continua criança. “Em todo homem há uma criança que deseja brincar...“ (Nietzsche). E todos temos o nosso saco de brinquedos. A fala somos nós abrindo o saco e despejando brinquedos...


O saco de brinquedos: isso é de fundamental importância, quando o amor está em jogo. A paixão acontece quando, fascinados por uma imagem – pode ser um jeito de olhar, um jeito de sorrir, um jeito de falar... - imaginamos que dentro daquele corpo de imagem fascinante estão guardados os brinquedos com que gostamos de brincar. O que vemos é a imagem da pessoa amada, mas o que imaginamos são os brinquedos que julgamos guardados dentro dela. A imagem, sozinha, logo se transforma em monotonia.
Ninguém consegue ficar o tempo todo contemplando a pessoa amada, por bonita que seja. O que alimenta a paixão não é a imagem mas os brinquedos que ela guarda... Hermann Hesse dizia que a pessoa objeto do nosso amor é apenas um símbolo, uma lagoa onde o rosto da “Outra“ aparece refletido. Que Outra? Aquela que imaginamos. Veja esses versos de Fernando Pessoa. Mas leia bem devagar...


“Amamos sempre, no que temos,
O que não temos quando amamos.
O barco pára, largo os remos
E, um a outro, as mãos nos damos.
A quem dou as mãos? À Outra.
Teus beijos são de mel de boca,
São os que sempre pensei dar,
E agora a minha boca toca
A boca que eu sonhei beijar.
De quem é a boca? Da Outra..."

Rubem Alves.

Tarde chuvosa de uma quinta-feira cinzenta ,decor perfeito para sonhar com os brinquedos do amor.

6 comentários:

  1. querida Gizelda.
    amei este seu post. veio mesmo de encontro ao que penso.por isso, é que quando nos desiludimos com alguém, a culpa nunca é desse alguém e sim nossa. nós é que víamos "O/A OUTRO/A" naquela pessoa... porque aquela pessoa foi sempre a mesma.
    beijo no coração

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  2. Gizelda,

    Fiquei muito feliz por ter apreciado a minha foto, meu blog e passar a ser uma seguidora minha. Mas mais feliz ainda fiquei porque pude conhecer o seu trabalho que adorei. Hoje podemos falar que somos seguidoras uma da outra e principalmente parceiras.
    Foi um prazer te conhecer,
    Bjos.

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  3. Querida Em@...

    Gosto da simplicidade com que o R.A. fala do cotidiano.Ele escreve , na maioria das vezes, algo que sinto que poderia ter escrito.

    E esse tema é providencial.As pessoas amam o que esperam que o outro seja, não o que ele é.Talvez esse seja o grande descompasso do amor.

    beijo.

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  4. Mravilha sua chegada Sueli.
    Sinta-se em casa. Vamos nos visitar muito em 2011.

    Beijo.

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  5. Mas é assim que nós vemos a pessoa amada. Achei interessante essa ideia dos "sacos de brinquedos" e adorei o post. Fernando Pessoa veio fechar com chave de ouro o que escreveu Ruben Alves.
    Beijo e um bom domingo.
    Graça

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  6. Querida Graça...

    FP cabe em qualquer lugar.E Rubem Alves é habitual nos meus posts , porque fala das mazelas do coditiano nas quais ele transita muito bem.

    Também achei muito boa a ideia de um saco de brinquedos...

    beijos.

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